5 de junho de 2009

Nosso


A minha mão desenhava as curvas do teu rosto num calor calmo e aconchegante. A nossa verdade era silenciosa. O quarto enchia-se connosco. Estávamos na foto da parede, no debruado do lençol, na roupa espalhada no chão, no pavio da vela de chocolate, na lírica de “Fast car”, de Tracy Chapman.
Dávamos as mãos, éramos o molde perfeito um do outro. Nunca to disse, mas sabia-me bem o teu silêncio, saber que não era preciso explicar nada. Vamos até a barragem, ver o pôr-do-sol, sentir a pele beijada pelo ar quente de Agosto. Voltamos para um mergulho, depois vamos para casa sem obrigações nenhumas, como tu gostavas. Adorava calcorrear o empedrado. Sei exactamente o cheiro, é um misto de flores, feno seco, animais da terra e fumo que sai das chaminés. O sino toca a cada hora, só o tempo não passa para nós.
Estudávamos os dois, entre bilhetes de amor. Cozinhavas para mim, quase sempre o mesmo, mas sempre bom. Punhas as mudanças com a mão esquerda para não deixares de tocar a minha perna e eu gostava de ouvir as tuas músicas, de que nunca sabes as letras.
Constrói-me frases com cereais de letras, abraça-me para que o amanhã não chegue, apanha-me papoilas na Primavera, segreda-me os teus segredos, pergunta por mim, adivinha-me, partilha comigo.
Mas se tiveres de ir, não adormeças o teu âmago, quem és. Diz-me adeus, mas deixa comigo as memórias das nossas coisas boas e guarda-me um lugar num cantinho do teu coração.

Sem comentários:

Enviar um comentário

8s e 80s