A face do medo
É suja, é grotesca
Agarra-se a estranhos
Numa sucção dantesca
Diz mal de quem teve
Do próximo e do que há-de vir
Não é mais do que o vazio
Que antevê no porvir
Maltrata, estiliza, goza
Inveja, cobra e desdenha
Sem fraque ou farpela
Que lhe justifique a façanha
Faz gaúdio do pouco que vale
Sobe o queixo de fraca figura
Arreganha o sobrolho,
Cospe na fervura
Não põe a mão no peito
Não contesta o que projecta
Não sabe que o outro
Lhe adivinha a intenção abjecta
Por isso definha
Numa vida de existir
A caminhar, a respirar
A sofrer, a extinguir
O circo já terminou,
Os palhaços abandonaram a cena
O medo ficou sozinho
Num futuro que dá pena
E das cinzas do fim dos dias
Ergue-se a justiça devida
A face do medo
Foi quem perdeu a vida